Meus queridos amigos, anteontem foi um dia muito feliz. Apesar da chuva forte que caiu sobre São Paulo desde as cinco horas da tarde, a falta de luz em alguns bairros e o trânsito caótico que parou metade da cidade, o auditório da Saraiva Megastore foi pequeno em alguns momentos para conter a multidão que foi até lá para conhecer “Kaori”. Agradeço do fundo do coração a todas as pessoas que de uma forma ou de outra acreditaram no livro e ajudaram a divulgá-lo. Agora, a minha pequena vampira e seus companheiros de universo fantástico estão andando sozinhos pelo mundo, sem o meu olhar protetor de mãe.
Mas vou lhes contar o porquê do meu silêncio de ontem. Depois de um dia auspicioso, o Day After trouxe uma notícia muito triste, que me fez passar o dia procurando notícias pela internet, chocada com o comportamento de alguns seres humanos, que fazem vampiros, lobisomens e criaturas monstruosas de fantasia se recordarem de forma dolorosa que nada, mas nada mesmo, supera o bicho homem em matéria de desrespeito a um outro ser humano.
O escritor Kizzy Ysatis (Clube dos Imortais, O Diário da Sibila Rubra, Território V) e a cineasta e atriz Liz Vamp foram agredidos ontem de manhã pelos seguranças de uma casa noturna – chamada apropriadamente de “A Loca”, dado o descontrole emocional e moral demonstrado pelos seus funcionários – quando saíam, depois de passar a noite comemorando o aniversário de Liz. Uma tola e medíocre discussão sobre uma comanda perdida levou duas pessoas íntegras, talentosas e cheias de boas intenções a um hospital. E poderia ter sido pior, não fosse a chegada dos policiais.
Vi, estarrecida, a foto de Kizzy na internet, com o rosto desfigurado pelo espancamento. A imagem das marcas roxas no corpo de Liz. Ele está deixando o hospital só esta manhã, 24 horas após o ocorrido, depois de constatar que houve fratura craniana, mas sem danos ao cérebro. Ela, graças aos céus, foi liberada ainda ontem de manhã. Poucas horas antes, ambos estavam sorridentes e felizes na Saraiva, comemorando comigo o nascimento de “Kaori”.
Liz estava linda, a sua presença enche qualquer ambiente de personalidade. Eu a encontrara na terça feira na entrevista ao programa “Mulheres”, na TV Gazeta, e havíamos conversado bastante enquanto esperávamos a hora de entrar em cena. Uma mulher sólida, forte, engajada na luta contra discriminação e preconceito. E, ao mesmo tempo, uma menina doce e caprichosa, que gosta de se enfeitar, de dançar, de sorrir. Sempre sincera, autêntica, corajosa. Antes de sair para a balada, ela tinha me dito, com o seu largo sorriso e segurando as minhas mãos: “vamos com a gente, hoje é o seu dia, menina. Tem que comemorar!” Mas eu tinha planos bem mais domésticos de comemoração e acabei não aceitando o convite.
Kizzy sempre foi como um irmão um pouco amalucado, um fenômeno da natureza como o sol e a chuva. Chegara na Saraiva esfuziante, me abraçando e gritando a plenos pulmões, “você está lindaaa!” Tinha me contado às gargalhadas, nos dias anteriores, que havia arranjado uma roupa especial de “gato” para ir ao evento, mas não podia engordar, pelo risco de não caber na vestimenta. Havia escrito, com uma generosidade rara, que estava tão feliz com o lançamento de “Kaori”, como se fosse um livro dele, num dos tópicos da comunidade. E, antes de tudo isso, tinha lido os originais de “Kaori” com afinco, para cumprir os seus compromissos de faculdade ao mesmo tempo em que cumpria a promessa feita a esta amiga escritora, de escrever uma frase sobre o livro. Desde sempre, Kizzy havia sido um tio brincalhão, entusiasmado e alegre da minha Kaori.
Duas pessoas queridas, honestas ao extremo no seu modo de encarar a vida, e de fazer as suas opções na intrincada rede de escolhas no nosso dia a dia complexo. Dois amigos não apenas meus, mas de todos nós, que damos valor à liberdade de se expressar sem medo em palavras, atitudes e aparência o que somos por dentro. Dois espíritos delicados, frágeis e sensíveis que precisam ser protegidos e defendidos neste momento por nós, seus colegas de caminhada, que amamos o Horror na ficção. Mas repudiamos o horror feio e monstruoso da vida real.
Por isso, vamos deixar clara a nossa revolta pelo comportamento selvagem de alguns dos nossos irmãos de raça, meus queridos seres humanos. Assim como existem pessoas amáveis e doces como Kizzys e Liz Vamps entre nós, há aqueles que ainda têm muito a aprender em matéria de humanidade. E a esses, vamos ensinar, todos, a serem seres humanos melhores.
Vamos colocar a criatividade para repudiar com veemência esse ato de puro horror. Que cada um de nós contribua, sem violência ou ódio, para mostrar o quanto esse tipo de comportamento é prejudicial a toda a sociedade. Vamos continuar espalhando essa mensagem.
Há um relato bem completo, feito por Lorde A, na Rede Vampyrica. Se quiserem saber os detalhes do acontecido, acessem aqui:
http://redevampyrica.com/home/?p=322E que Kizzy e Liz fiquem bem. Pois o bem deles é o bem de todos nós.